quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Conheça o Conselho das Treze Avós Nativas

Mulheres dos quatro cantos do mundo se reuniram para formar o Conselho para preservar a sabedoria dos ancestrais indígenas


Reportagem: José Augusto Lemos 

As mulheres se reuniram para preservar rituais e a sabedoria dos
ancestrais indígenas
Foto: Marisol Villanueva / Grandmotherscoundlorg
Acredite ou não, tudo começou com uma aparição sobrenatural. É o que diz Jeneane Prevatt, responsável pela reunião do Conselho Internacional das Treze Avós Nativas, que reúne 13 senhoras que lutam pela manutenção da cultura e dos rituais indígenas. Pós-graduada em psicologia pelo Instituto Jung de Zurique, Jeneane atravessou um processo radical de transformação praticando Kundalini Yoga com um guru indiano. Com 25% de sangue indígena sob a pele branca, passou a receber visitas do espírito de sua avó cherokee, que a levou a aproximar-se das práticas espirituais dos índios americanos. Acabou tornando-se fundadora e líder de uma comunidade internacional chamada Kayumari, ligada à Igreja Nativa Americana, que tem como sacramento o cacto psicoativo peiote.
Uma visão veio em 1998 para confirmar o chamado, e outra peça do quebra-cabeça começou a se apresentar em uma frase mântrica que os membros da comunidade Kayumari ouviam: "Quando as avós falarem... Quando as avós falarem..."

O que iria acontecer quando as avós falassem? Nenhuma daquelas pessoas sabia disso ainda, mas diferentes tribos americanas traziam na memória uma antiga profecia, que dizia mais ou menos assim: "Quando as avós das quatro direções falarem, uma nova era estará nascendo".

Mulheres globais

As mulheres não precisaram de mais nenhum toque para transformar a visão em ação. Intitulado Global Women’s Gathering ("Reunião de Mulheres Globais"), o primeiro encontro, realizado em outubro de 2004, se anunciava com a proposta de "alinhar a sabedoria das mulheres indígenas com a sabedoria das mulheres ocidentais". Treze avós representavam povos nativos dos quatro cantos da planeta.



O resultado pode ser testemunhado no documentário For the Next Seven Generations ("Para as Próximas Sete Gerações", 2009), que acompanha o Conselho, desde essa primeira reunião, em diversas viagens ao redor do mundo. Inédito no Brasil, mas com trechos disponíveis no YouTube e no site www.forthenext7generations.com, o filme registra desde a empatia imediata entre as Treze Avós até a comoção causada entre a plateia e as estrelas mais notórias do evento.

"Nós focalizamos as semelhanças, não as diferenças. Dessa forma criamos relacionamentos", afirma Mona Polacca - de sangue hopi, tewa e havasupai, nações do grande deserto que se estende do Arizona ao Novo México. O principal traço em comum ficou evidente já na programação do evento: todas são mulheres de prece, e três vezes por dia, elas se reuniam para oferecer, uma de cada vez, uma oração. Rezar pela paz mundial, pelas crianças e pela cura da Mãe Terra é uma das atividades centrais do Conselho - e, dependendo da orientação da Avó que estiver conduzindo a cerimônia, essa prece pode transformar-se num ritual de purificação, desencadeando catarse e arrebatamento no público.

Patrimônio

A avó maia-nicaraguense Flordemayo, por sua vez, revela afinidades com a brasileira Maria Alice. Fundou, no Novo México, o Institute of Natural and Traditional Knowledge ("Instituto de Conhecimento Natural e Tradicional"), ONG etnobotânica muito parecida com o CMF de sua colega amazônica. Entre outros projetos, mantém um Banco de Sementes, para salvaguardar as plantas do risco de virarem todas "comida frankenstein": alimentos transgênicos. Enquanto isso, a avó de etnia iúpique (vulgarmente conhecida como "esquimó") Rita Blumenstein pode ser facilmente confundida com a nipobrasileira Clara. Enquanto esta dirige um centro de caridade no meio da floresta, Rita trabalha nos hospitais do Alasca como a primeira curadora xamânica a receber certificado legal para isso. Saúde e educação não poderiam deixar de ser questões-chave para o Conselho, e essas mulheres encontram aqui seu campo de ação privilegiado.

Já a militância das avós lakotas voa mais alto: fizeram o Conselho assinar uma carta ao Vaticano, requisitando a revogação de uma série de bulas papais do século 15, que davam às Coroas espanhola e portuguesa direito de matar todos os "pagãos" que não quisessem se converter ao cristianismo, apoderando-se de todas suas propriedades. Passados cinco anos sem resposta, as Avós não perdem a fé, nem deixam de rezar "para todas as nossas relações". Conforme explica a vovó Rita Long Visitor Holy Dance, "isso inclui até o seu pior inimigo".

LIVRO
Grandmothers Counsel The World, Carol Schaefer, Editora Trumpeter

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